De acordo com o Presidente da Comissão dos Assuntos Constitucionais, Direitos Humanos e de Legalidade, António Boene, a Constituição da República de Moçambique abre espaço para o Presidente da República decretar novo Estado de Emergência. Para Boene, não obstante a Constituição da República não indicar taxativamente o que se deve fazer em caso de agravamento das razões que levaram a declaração até ao limite do Estado de Emergência pode-se decretar um novo Estado de Emergência.
“Quanto a possibilidade de decretar-se ou não um novo Estado de Emergência ou optar-se pelo Estado do Sítio, eu mantenho a mesma posição de que sim a constituição abre espaço para decretar-se um novo Estado de Emergência ou então o Estado de Sítio. E é preciso fazer-se uma interpretação desapaixonada da constituição. Temos que olhar para o momento de aplicação das normas constitucionais, qual é o sentido e o alcance que se tem em vista com estas normas".
Segundo Boene, no que concerne ao número de limitações que a constituição estabelece para a prorrogação do Estado de Emergência, tendo o Presidente da República atingido e persistindo as razões que ditaram a declaração do Estado de Emergência, para o orador, o que mais parece correcto, é decretar o Estado de Sítio obedecendo, contudo, os limites constitucionais.
"De início, oque determinou a declaração do Estado de Emergência é que existiam oito casos positivos. Hoje são 1700 e com tendência a subir. É evidente que as razões que determinaram o Estado de Emergência alteraram-se grandemente. E a constituição não nos diz, na eventualidade destas razões que determinaram a declaração do Estado de Emergência agravarem-se oque é que pode ser feito a posterior. E nós temos que arranjar soluções para estes casos. Significa que não persistiram as razões que determinaram a declaração do Estado de Emergência, pelo contrário estas razões agravaram-se. Significa que, no meu entender, justifica-se caso haja necessidade que se decrete um novo Estado de Emergência".
Para o Presidente da Primeira Comissão da Assembleia da República, tudo depende das circunstâncias e da informação disponível para se decidir sobre um novo Estado de Emergência ou Estado de Sítio ou ainda poderá se optar por outras prerrogativas como a lei de gestão de calamidades onde se pode aplicar medidas administrativas de carácter excepcional.
Por sua vez, o Deputado da Assembleia da República, Venâncio Mondlane, para a situação do Estado de emergência, a Constituição da República não abre espaço para a declaração do Estado do Sítio, porque a Constituição trata os termos (emergência e sítio) da mesma forma.
“Porém ressalva-se que a falta de clarificação destes conceitos poderá gerar constrangimentos múltiplos: primeiro, a confusão na sociedade, por outro lado a irresponsabilidade governativa na medida em que com as frequentes declarações há famílias que sofrem devido a situação em que se vive daí a necessidade de se definir claramente em que consiste a declaração com cada conceito".
Segundo Venâncio, o debate sobre Estado de Sítio, Emergência e/ou de Gestão de calamidades é demasiado primário uma vez que passados 120 dias de restrições as atenções deviam estar voltadas para a necessidade de medidas urgentes e mais fortes para recuperação económica.
Contrariamente ao pensamento dos outros interlocutores, o académico moçambicano, Eduardo Namburete é céptico quanto a declaração do novo Estado de Emergência ou Estado de Sítio, remetendo ao Chefe de Estado a alternativas administrativas de estado de calamidade. “Se voltarmos ao Estado de Emergência ou estado de Sítio estaremos a desvirtuar a Constituição porque não faria sentido nenhum o legislador ter colocado limites para este tipo de situações”, disse o académico.
Por sua vez, Osman Cossing, Gestor de Programas no IMD, alertou para o facto das divergências em termos de interpretação das normas constitucionais entre pessoas entendidas na matéria justifica a necessidade urgente de se preparar o cidadão para o pós- Estado de Emergência para que esteja informado para a nova realidade.
“E importante que haja mais sensibilização e consciencialização do cidadão e envolver mais actores no processo, como são os casos de lideranças comunitárias, religiosas e se reforçar os níveis de fiscalização para os sectores que são passíveis de fiscalização”, disse Cossing.
No que tange a avaliação da implementação das medidas no Estado de emergência, Cossing sublinhou que o IMD tem estado a fazer alguma monitoria da implementação de Estado de Emergência e sua percepção que, no que diz respeito às medidas de Estado de Emergência, tiveram, parte delas grande eficácia, que de alguma forma poderão ter contribuído para retardar o pico da Covid-19.
Estas posições foram apresentadas durante uma sessão de diálogo virtual, promovido pelo Instituto para a Democracia Multipartidária (IMD), que tinha como principal objectivo refletir sobre as “Perspectivas jurídicas Pós- Estado de emergência devido a Covid-19”.